No quarto de Hotel

 Raquel esboça um sorriso, tenta disfarçar a ironia folheando um manual de tantra, Eduardo, encostado em seu corpo nu, procura nas mesmas linhas do livro alguma resposta. 

 De bruços na enorme cama, ela vira a próxima página ele a interrompe segura a sua mão e aponta para um trecho do texto o qual descreve uma técnica sobre orgasmos simultâneos. 

 Lê para ela em voz alta, avança para as próximas páginas, ela se esforça, não consegue tirar da cara, o riso contido no canto da boca, com a mão no queixo, ouve sem prestar atenção à leitura do marido.

 —  Olha isso Quel, veja, aqui tem cada detalhe do que precisamos, nada vai nos impedir de chegarmos onde desejamos, não precisamos de mais nada, além de praticar e entregar, praticar e entregar, olha essa vista maravilhosa! —  Aponta para a janela com vista para o mar. —  Podemos transformar esta experiência na coisa mais incrível de nossas vidas! 

 A bela mulher continua calada, sentada na cama olha para o companheiro de cima para baixo, sem muito esforço recorda da última viagem para aquele mesmo litoral nordestino e de quando iniciaram as práticas do tantra.

 Ainda sem roupas, Raquel levanta e vai até a janela, ambos percebem um homem no apartamento do prédio ao lado que os observa, podia vê-los nitidamente, Eduardo para de ler e senta na cabeceira, contempla a silhueta da esposa cobiçada por um estranho.

 —  Será que faz tempo que ele está lá? —  Disse ele.

 —  Não sei, tomara que sim. —  Disse ela.

 —  Como assim? Qual a beleza em testemunhar algumas tentativas frustradas? 

 —  A beleza de reconhecer-se em outro ser humano em sua plenitude, meu amor. 

 —  Deixe a cortina aberta, quem sabe ele não nos inspire? —  Disse ele.

 Próxima a janela, ela encara o homem enquanto acaricia o mamilo, molha o dedo na saliva e segue acariciando o próprio corpo.

 —  Sim, eu vou deixar aberta, quantos anos será que ele tem? 

 —  Uns quarenta e cinco, cinquenta? 

 — Será que mora na cidade? —  Ora olha para o marido, ora olha para o vizinho, faz as perguntas intercalando com os gestos que sugerem um convite. —  Será que tem alguém? 

 Eduardo se  excita e levanta da cama, a puxa com força por traz, ela fecha as cortinas antes de se entregar ao sexo com marido. 

 Por quase duas horas, deleitam-se em uma transa intensa que a meses não tinham, Raquel o olha com paixão. 

 Ela enrola na ponta do dedo os pelos de seu peito, enquanto o ouve falar sobre a sua crença de que aquela fase, haveria de ser a melhor em todos os anos de suas vidas, então o interrompe.

 —  Mas você ainda não superou, meu amor, ainda está sofrendo muito. 

 —  Eu não sei como você consegue lidar dessa forma, não entendo a sua tranquilidade com tudo isso, mas ainda assim, eu… eu não acho que estou sofrendo não! 

 —  Está sim Eduardo, admita para você mesmo, estamos trancados neste quarto a quase uma semana, não aproveitamos nada da cidade… 

 —  Ainda! 

 —  Tudo bem, AINDA… Sei que ainda teremos muito a aproveitar, conhecer, explorar. 

 —  E eu, também sei que você não está me julgando por eu ter broxado todos estes dias! —  Acaricia o rosto de Raquel.

 —  Claro que não, até porque você não broxa meu amor, nós dois sabemos muito bem a causa de só termos conseguido transar apenas hoje! 

 —  Você quer dizer, de eu não ter broxado agora também, né?

 —  Para com isso Eduardo, eu já falei que isso não tem a ver com broxar! 

 —  Ah não? E o que é então? Você estava excitada o tempo todo,  me provocando e nada do meu pau subir, qual o nome disso Raquel? 

 —  Eduardo, Eduardo meu amor… Pare de tentar tapar o sol com a peneira, você está magoado, está triste, está sofrendo. Só isso, aliás, é tudo isso! E o que não é pouca coisa! 

 —  Ah é? E como você explica este sexo maravilhoso que acabamos de fazer agora? Já que tenho toda essa mágoa em meu peito? 

 —  Tivemos uma ajudinha que o distraiu, não é meu amor? Por alguns instantes você esqueceu o que está sentindo. Aliás, por onde anda nosso amigo agora? —  Ela levanta da cama e se aproxima da janela, abre a cortina e não viu ninguém. —  Poxa, que pena! Só por que iríamos deixá-lo assistir sem véus desta vez! —  Disse ela. 

 Ambos se olham e sorriem.

 Eduardo levanta, ligaria na recepção para pedir um drink, Raquel o interrompe, sugere que se aprontem para sair um pouco do quarto para curtir a noite à beira mar, ele senta na beirada da cama quieto de cabeça baixa, não se mexe, ela o olha com ternura, faz um carinho em seus cabelos lisos e o abraça.

 —  Tudo bem meu amor, fique tranquilo, não precisamos sair do quarto, vamos apenas tomar um banho, pede uma pizza pra gente, estou faminta.

 —  Vinho e marguerita?

 —  Ótima pedida, pede e vem logo para a água comigo.

  Ele faz o pedido à recepção, ambos vão para o banho e demoram na banheira entre brincadeiras e sorrisos, relembram as tantas viagens que fizeram na última década,  saem do banho, recebem a comida e voltam para a cama, ali mesmo se ajeitam para comer.

 Eduardo continua tagarelando, começa a falar sobre os planos para a próxima semana, os pontos turísticos, as baladas e uma infinidade de passeios que fariam nestas férias, Raquel em silêncio olha fixamente para a janela enquanto mastiga seu pedaço de pizza.

 —  Pode falar, eu sei que está se controlando, fale. 

 —  Na verdade, não sou eu quem tenho que falar né Edu? 

 —  Raquel, você me conhece como a palma da sua mão, mas tem coisas em mim, que eu mesmo desconheço, eu nunca imaginei que me doeria tanto assim uma traição. 

 —  Mas não houve traição, meu amor! 

 —  Como não? Um caso extraconjugal sem o conhecimento do outro, não é uma traição? 

 —  Olha Eduardo, depende! 

 —  Depende de quê Raquel?

 —  Dos acordos que são feitos antes, se não há acordos tudo é muito relativo meu amor! 

 —  Você e sua mania de relativizar tudo! 

 —  Não é bem assim Eduardo, não seja injusto, você sabe muito bem o quanto tudo isso me machucou e me machuca ainda! 

 —  Estou sendo egoísta, né? 

 —  Está sim! —  Disse ela.

 —  Me desculpe! Eu sinto muito. —  Disse ele.

 Ambos ficam em um longo silêncio, cada um em um canto do quarto contemplam a vista para o mar.

 Ele caminha pelo quarto e ameaça sair pela porta, ela apenas observa, ele continua caminhando de um lado para o outro, se aproxima de Raquel, segura firme em seus braços olha fixa e profundamente em seus olhos, a palavra fica presa em sua garganta.  Ela o interrompe em sua fala engasgada.

 — Liga para ela! —  Disse Raquel.

 Ele solta seus braços, volta a caminhar pelo quarto de um lado para o outro ainda mais rápido, veste uma camiseta e uma bermuda, calça o tênis, pega o celular, desce até o bar do hotel, pede um drink e faz a ligação.

 Stella atende, chora de soluçar.

 —  Perdão, perdão, perdão… —  Repete ela do outro lado da linha.

 Eduardo aos prantos pede para que Stella fique em silêncio, aos poucos ambos se escutam e não conseguem conter a felicidade da conversa suspensa a meses, em quase meia hora de ligação compartilharam as mais lindas juras de amor, Stella compra a passagem aérea para o dia seguinte. 

 No quarto do hotel, abraça, morde, cheira, aperta, não sabe qual dos dois primeiro e ao mesmo tempo faz com ambos.

 Os três se jogam na cama e se amam como nunca.

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