O filme Thelma e Louise é sobre a busca pela liberdade feminina contra a prisão imposta por homens egoístas. Logo de início, o roteiro nos mostra a vida agitada de Louise como uma garçonete numa cafeteria. O local é cheio, movimentado e ela está no meio desse mundo agitado buscando novas experiências ao ligar para Thelma, sua amiga, e juntas saírem das vidas comuns. Do outro lado vemos Thelma, uma esposa comum que teme falar com o marido sobre viajar com amiga. Logo que vemos a fala e reação do marido de Thelma, fica claro o quão bruto ele é com a esposa. Curiosamente o roteiro deixa claro que ambas estão servindo café. Em outras palavras, ambas são coadjuvantes e apenas servem aos outros, aos homens e ao sistema.
A fuga dos respectivos mundos comuns é realizada, e a personalidade de cada uma fica mais latente. Thelma é ingênua e medrosa. Até na forma de vestir fica claro o seu estilo “esposa de casa”. Louise é o oposto, uma mulher que parece mais velha, rosto endurecido pela vida, ousada, corajosa e independente. O roteirista dá pistas de que algo muito ruim aconteceu no passado que a fez ficar dessa maneira. A ingenuidade de Thelma é escancarada quando um homem a seduz e a leva para o estacionamento para violentá-la. Louise chega e a salva, matando o homem. É o ponto de virada que transforma a fuga dos maridos e amantes numa fuga da própria lei, que, várias vezes citado pelo filme, é tendenciosa e protege mais aos homens. Thelma precisa aprender que ela pode e deve se soltar das amarras sociais, mas precisa ser sempre vigilante.
A trama progride e Thelma cada vez mais se transforma de uma jovem inocente para uma adulta esperta. Outro homem surge na vida de Thelma e rouba o dinheiro que Louise tinha guardado. Situações adversas que transformam a personagem. Louise, por outro lado, começa a ficar mais abalada com toda situação da fuga frustrada. Além disso, ela é ajudada por um homem que gosta dela, mas fica claro que este só a queria por perto como forma de controle, e não como um verdadeiro amante.
O tema da história é justamente sobre isto: mulheres conquistando independência fazendo o que desejam, mas sem qualquer sombra de um homem.
Aliás, durante todo o filme, reforça-se o tema por meio de personagens masculinos canalhas e de mau caráter, que só enxergam as mulheres como objetos.
Destaco aqui que, após ponto dramático no meio da história, que é quando Thelma é roubada por homem bonitão, cada vez mais Thelma enxerga o quão inocente ela tem sido e o quão isso tem afetado a fuga delas. Enquanto Louise se abala cada vez mais com as adversidades, Thelma ganha força, bravura e coragem. Até o modo de vestir dela é alterado. Um ponto interessante do roteiro é que temos um policial investigando o caso e que aparenta querer ajudá-las, principalmente a Louise. Contudo, ficamos desconfiados porque durante todo o filme os homens oprimem ou abusam das mulheres de todas as formas. Esse mistério é bem trabalhado no roteiro e, mesmo no final do filme, quando Thelma e Louise se jogam no carro de penhasco e o detetive corre para tentar evitar o pior, terminamos com essa dúvida na cabeça: seria o detetive o único homem bom que realmente queria ajudá-la ou seria apenas um plano para captura? A julgar por toda abordagem do filme, creio que só queria capturá-la a todo custo, até porque a situação se agravou tanto, que, pela lei, seria impossível salvá-las.
O roteiro é excelente também porque as complicações progressivas tornam-se um caminho sem volta. Para cada situação adversa que acontece, cada vez mais não há como voltar atrás. É como um funil que é bem aberto na parte superior e bem estreito na parte inferior. A resolução do filme se afunila para dois caminhos: ou elas se entregam e vão presas ou elas continuam na fuga e em alguma hora morreriam pela polícia. Elas se renderem para a polícia traria uma mensagem de que a busca da liberdade desenfreada causa problemas em alguma hora. E, subliminarmente, a julgar pela mensagem do filme, afirmaria que no final a lei, que protege mais os homens, e os próprios homens, teriam vencido contra a luta feminina. O filme opta pela única resolução possível para que a mensagem da liberdade e da independência feminina seja entregue. É melhor morrer tendo realizado muitas coisas loucas e sem a dependência do homem do que viver uma prisão da falsa modéstia, da masculinidade egoísta e de um sistema tendencioso.